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Brasil reescreve a sua história ao revelar detalhes da ditadura militar CNV entrega à presidenta Dilma relatório que confirma morte e desaparecimento de 434 pessoas durante a ditadura 10/12/2014 CNV entrega à presidenta Dilma relatório que confirma morte e desaparecimento de 434 pessoas durante a ditadura No Dia Internacional dos Direitos Humanos, Comissão Nacional da Verdade entrega à presidenta Dilma relatório que confirma morte e desaparecimento de 434 pessoas durante a ditadura. A comissão não tem caráter deliberativo e o fim da Anistia é um objetivo considerado difícil de alcançar na corte máxima de Justiça, mas, para além das recomendações concretas, o volume de informações sobre as mortes de 434 vítimas e depoimentos tem voltagem suficiente para provocar mal-estar nas Forças Armadas e em setores civis coniventes com as violações à época. Nas mais de 1.300 páginas entregues à presidenta Dilma Rousseff, ela própria presa e torturada pelos militares e ouvida no documento, o texto detalha, além dos métodos de tortura, execuções, ocultação de cadáveres, detenções ilegais e desaparecimentos forçados que, “dada a escala e a sistematicidade com que foram cometidos, constituem crimes contra a humanidade, e não são passíveis de anistia”. Pelo relatório desfilam depoimentos de mulheres violentadas; de mães que perderam os filhos; de militantes políticos que perderam seus companheiros; de advogados que andavam de lá para cá o dia todo com uma máquina de escrever em um carro para defender os detidos; de assassinos que descrevem como matavam impiedosamente. Descrevem-se ainda os lugares de tortura, as celas, as empresas envolvidas e as ramificações internacionais da repressão brasileira, entre outros capítulos dessa época pavorosa. Dilma se emociona e lembra: "a verdade liberta..." Com a conclusão dos trabalhos da comissão, o Brasil encerra um capítulo que os vizinhos Argentina e Chile, que também atravessaram regimes militares, completaram há alguns anos, antes de começar a julgar violadores. Dilma avança na agenda que começou com Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), o hoje opositor que em seu primeiro ano decretou a reparação de vítimas, e seu mentor e antecessor, Lula (2003-2010), que estabeleceu comissão para relatar o caso de mortos e desaparecidos. Parte do sexteto que dirigiu a Comissão da Verdade, que trabalhou desde 2012, a advogada Rosa Maria Cardoso da Cunha disse ao jornal EL PAÍS crer que a pressão popular é a melhor maneira de fazer valer as recomendações do documento e “cumprir os pactos internacionais dos quais o país é signatário”. Rosa Maria se refere à incompatibilidade entre a Lei da Anistia, que fez perder efeito “crimes políticos e conexos”, e a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos), da qual o Brasil é membro, que já declarou que a legislação é incompatível com a Convenção Americana de Direitos Humanos por considerar que “perpetua a impunidade”. “Estamos submetidos a estes pactos que assinamos. A Constituição exige que eles sejam cumpridos”, disse a advogada. Na prática, a punição aos torturadores parece distante: o Supremo Tribunal Federal – mais alta corte do país – já julgou uma ação de inconstitucionalidade contra a Lei de Anistia em 2010, e considerou que ela se aplica mesmo para casos de tortura e crimes comuns cometidos por agentes do Estado. Um recurso da Ordem dos Advogados do Brasil ainda está pendente de julgamento e deve ser analisado pelo tribunal em breve. A composição dos ministros do Supremo atual é diferente da de 2010 e pode ter mudanças nos próximos anos que incline a balança em outra direção. Até o fim de 2018, a presidenta Dilma Rousseff deverá indicar substitutos do ministro Joaquim Barbosa, que se aposentou, e de ao menos outros cinco magistrados que completarão 70 anos no período e terão de se aposentar compulsoriamente. De acordo com Marcelo Figueiredo, professor de direito constitucional da PUC-SP, o Congresso Nacional poderia mudar esta situação editando uma nova lei que suspenda o efeito da anterior. Atualmente dois projetos de lei que cancelam a anistia irrestrita estão parados no Parlamento. “O Supremo não pode legislar sobre uma matéria que já analisou sem que hajam fatos novos, e a presidenta Dilma não pode editar uma medida provisória revogando a lei, já que este é um assunto de Direito Político que cabe exclusivamente ao Congresso, segundo a Constituição”, afirma. Como obstáculo a uma legislação que penalize os torturadores, Figueiredo ressalta o fato de que a Câmara e o Senado eleitos este ano têm a composição mais conservadora das últimas eleições, e que “essa não é uma prioridade para eles no momento”. “Se a sociedade e as ONGs que militam na área dos Direitos Humanos não se mexerem, as recomendações serão letra morta”, conclui Figueiredo. A esperança de muitos dos defensores da punição aos violadores é que o documento municie procuradores e promotores a avançar em processos nas primeiras instâncias, por enquanto. Já o temor em alguns setores do governo é que a divulgação do calhamaço traga mais um elemento de tensão para Dilma num momento de montagem do segundo mandato e de reacomodação da base de apoio do governo no Congresso. Tem sido até agora sem sobressaltos a delicada relação de uma presidente ex-torturada com a hierarquia das Forças Armadas - que não flerta com os poucos que defendem golpe militar nas ruas, mas não parece disposta a fazer mea culpa pública pelos crimes e resistiu a colaborar integralmente com a Comissão da Verdade. Recentemente, clubes de militares da reserva protestaram ativamente dizendo que o documento é parcial por não compilar crimes da “esquerda” que combateu o regime. Desmilitarização das polícias estaduais Segundo o documento, as detenções arbitrárias, tortura, execuções, desaparecimentos forçados e ocultação de cadáveres comuns no país hoje se devem ao fato de que “as violações (…) verificadas no passado não foram adequadamente denunciadas, nem seus autores responsabilizados, criando-se as condições para sua perpetuação.”
(Fonte: Gil Alessi - El País) Veja também |