“Não podemos aceitar que o futuro das big techs é o único possível. Não podemos renunciar a condição humana”, disse o neurocientista Miguel Nicolelis, para alunos do Programa Jovem Aprendiz, da Escola Técnica Mesquita e um pequeno grupo de dirigentes sindicais. A conversa de mais de uma hora foi marcada por emoção, lembranças do neurocientista e fortes críticas ao capitalismo de vigilância e a inteligência artificial e ocorreu na tarde de sexta-feira (14), na sede do Sindicato dos Metalúrgicos da Grande Porto Alegre (STIMEPA).

Nicolelis abordou o impacto negativo do uso da IA e enfatizou que estamos perdendo capacidade cognitiva. “O ser humano é o único ser que trabalha para a sua destruição. Inteligência é atributo da vida orgânica e não de máquinas.” Segundo ele, o único objetivo da IA é automação da vida, inclusive a nossa, e que isso é mais uma etapa do capitalismo. “Para eles, não passamos de uma pilha de dados e isso é o chamado capitalismo de vigilância. Daqui dois ou três anos não haverá mais produção humana na Internet”, disse ele ao definir o momento atual como a maior crise existencial da nossa espécie.

Outro aspecto que o neurocientista enfatizou é que por conta desse cenário e do uso demasiado da IA, já não sabemos mais o que é verdade ou mentira. “E isso é muito danoso, pois o cérebro humano não sabe viver com a ambiguidade”, explicou ele ao defender que o “trabalho manual é a herança de toda a nossa ancestralidade.”
Nicolelis também contou sobre como nasceu seu projeto Instituto Santos Dumont (ISD), com duas unidades escolas na cidade de Macaíba, periferia de Natal no Rio Grande do Norte. Após, foi criada outra unidade escola no município de Serrinha, no nordeste Baiano. “Tivemos laboratórios melhores do que muita universidade. E começamos a incomodar, porque de repente tínhamos meninos da periferia de Natal entrando em universidades federais”, recordou.

Ele contou orgulhoso, que, em ambas as cidades, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), aumentaram consideravelmente. “Durante 10 anos mudamos a história desses municípios e da comunidade. Mas como era um projeto vinculado ao Ministério da Educação (MEC), o ministro José Mendonça Bezerra Filho, do governo de Michel Temer cortou os nossos recursos às vésperas do Natal de 2016”, disse.

O nome do Instituto, inspirado no brasileiro e pai da aviação, Santos Dumont, se deve porque para o neurocientista as escolas devem ser aeroportos. “Aviões precisam de aeroportos para decolarem em segurança”, sentenciou Nicolelis que finalizou afirmando que o maior desafio de sua vida é provar que “é possível usar a ciência como agente de transformação social.”
O médico paulistano, Nicolelis é referência mundial na neurociência. Por mais de 30 anos, foi professor e pesquisador no departamento de neurociência e engenharia biomédica da Universidade de Duke, na Carolina do Norte (EUA). Autor de diversos livros e centenas de artigos, atualmente, ele se dedica ao Instituto Nicolelis de Estudos Avançados do Cérebro, que pretende ajudar mais de um bilhão de pessoas com doenças medulares e neurológicas.
Abertura
“Só a sua presença aqui significa muito por tudo que o senhor representa na comunidade científica. Estamos muito felizes e honrados com essa conversa”, disse o presidente da Federação dos Trabalhadores Metalúrgicos do RS (FTM-RS), Lírio Segalla.
O coordenador do Macrossetor da Indústria da CUT-RS e diretor da Federação, Milton Viário, destacou a organização da categoria no estado “Nós, metalúrgicos da CUT-RS, temos peculiaridades e carregamos sempre a bandeira do Brasil porque temos muito orgulho do que produzimos. Temos uma Petrobras, a Embraer, tivemos Alcântara construída com indústria nossa. E também temos muito orgulho de ter Miguel Nicolelis”, declarou.

O presidente do STIMEPA, Adriano Filippetto explicou que os estudantes presentes integram o Programa Jovem Aprendiz e que desde 2006, a Escola Técnica Mesquita é uma entidade qualificadora do Programa e oferece formação técnico-profissional para adolescentes e jovens de 14 a 24 anos, aliando teoria e prática em atividades realizadas em empresas parceiras ou em ambiente simulado. “A Escola é mantida pelo Sindicato que tem um caráter solidário muito grande de atender e qualificar a nossa comunidade. Por isso, todos nós estamos muito honrados com a tua presença”, destacou.
O superintendente regional do Trabalho no RS, Claudir Nespolo e a diretora da Escola Técnica Mesquita, Claudete Souza, também estavam na mesa.
Após a conversa, Nicolelis respondeu perguntas dos alunos, atendeu os presentes, autografando livros e tirando fotos. Ele também conheceu as instalações da Escola Técnica Mesquita.
Fonte: FTM-RS