”Saúde é um direito e não mercadoria” Pela primeira vez, os metalúrgicos do Rio Grande do Sul pro
“Saúde é um direito e não mercadoria”
Pela primeira vez, os metalúrgicos do Rio Grande do Sul promoveram um encontro estadual de cipeiros. Coordenada pela Secretaria de Saúde da Federação dos Metalúrgicos, a atividade ocorreu no sábado, 24 de abril, e surpreendeu a todos pelo número de participantes: 60 cipeiros, representando indústrias metalúrgicas de diferentes regiões do Estado.
Para o secretário da Confederação Nacional dos Metalúrgicos (CNM/CUT), Edson Rocha, o crescente interesse em debater a saúde do trabalhador não se limita ao Rio Grande do Sul:
“Em todos os estados percebemos que os trabalhadores querem debater esse tema, pois não suportam mais as condições de trabalho, o aumento da pressão, o adoecimento e o descaso dos empregadores”, afirmou.
Ampliar a organização no local de trabalho
O encontro começou com um painel coordenado pelo médico do trabalho, Dr. Rogério Dorneles, com o tema “Saúde do Trabalhador e Organização no Local de Trabalho”.
Após ouvir várias perguntas dos cipeiros, o médico foi enfático:
“A melhor forma de enfrentarmos os problemas relacionados à saúde do trabalhador é ampliar a nossa organização no local de trabalho. Por isso, a CIPA é fundamental.”
Durante a palestra, foram apresentados dados alarmantes sobre os acidentes de trabalho. Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 2009 ocorreram aproximadamente 270 milhões de acidentes de trabalho no mundo. No Brasil, o número de acidentes cresce a cada ano.
“Falta bem pouco para atingirmos um milhão de acidentes por ano — e isso é indigno para qualquer país”, alertou o Dr. Rogério.
“Sabemos que todo empregador visa obter e aumentar lucros, por isso quer sempre pagar salários menores e explorar ao máximo a força de trabalho disponível. Infelizmente, não se preocupa com a saúde dos seus empregados. Isto é um fato. A saúde é uma preocupação do próprio trabalhador e de suas organizações sindicais”, concluiu.
Legislação tem de ser cumprida
No segundo painel, foram abordados aspectos legais. Para o advogado João Lucas de Mattos, especialista em Direito Previdenciário, embora a legislação brasileira seja considerada uma das mais avançadas, há falhas que impedem maiores avanços.
“O problema é que temos que lutar constantemente para que a legislação existente seja cumprida. O desrespeito por parte da classe patronal é espantoso em nosso país. É preciso reverter essa realidade e garantir que as leis sejam observadas”, defendeu.
Experiências que enriquecem a luta
No terceiro painel, Edson Rocha (CNM/CUT), Antonio Munari (STIMMME Canoas) e Alfredo Gonçalves (STIMMME Porto Alegre) — atual secretário de Saúde da Federação dos Metalúrgicos — compartilharam suas experiências como dirigentes sindicais na área de saúde do trabalho.
Munari relatou inúmeros casos de desrespeito e desumanidade nos locais de trabalho, incluindo um episódio sofrido por ele mesmo há mais de 10 anos. Por sua militância dentro da fábrica, em defesa de mais segurança, prevenção e melhores condições de trabalho, foi perseguido e humilhado. O caso de assédio moral, documentado em um dossiê, chegou à sede da OIT, em Genebra, que cobrou explicações do governo brasileiro.
“A empresa em que trabalho teve de se adequar à legislação e investiu pesado em segurança e prevenção. Deixou de ser uma ‘indústria de mutilados’ para ser hoje uma instituição que ainda gera doentes e acidentados, mas em número e gravidade bem menores”, relatou.
Gonçalves destacou os enfrentamentos com os agentes públicos, especialmente os peritos do INSS:
“Na maioria dos casos, eles estão lá para sonegar direitos. Quando os trabalhadores mais precisam, são abandonados pelo Estado. Vejo todos os dias trabalhadores doentes sendo negados pelo INSS”, criticou.
Rocha reforçou a necessidade de trabalho conjunto entre sindicato e CIPA:
“A união entre CIPA e Sindicato nos torna mais fortes. O Nexo Técnico Epidemiológico (NTEP) deve ser uma das nossas lutas prioritárias, pois essa legislação vincula certas ocupações a determinadas doenças profissionais. A CNI (Confederação Nacional da Indústria) entrou com ação direta de inconstitucionalidade contra o NTEP, e a CNC (Comércio) fez o mesmo contra o FAP e o SAT, que punem empresas que descuidam da saúde dos empregados. Se esses instrumentos caírem, nossa situação vai piorar muito”, alertou.
O primeiro de muitos encontros
Uma cipeira da Região Metropolitana comentou:
“Esse encontro foi muito proveitoso. Agora sabemos mais claramente o que devemos fazer.”
Outro cipeiro, do interior do Estado, destacou:
“No interior, os empresários acham que são donos do mundo. É muito difícil enfrentá-los. Encontros como este esclarecem e nos ajudam a pensar em ações mais conjuntas.”
O encontro terminou com uma confraternização e com a cobrança dos participantes para que a Federação e os sindicatos realizem mais encontros sobre saúde ao longo do ano.
“Esse encontro deve ser o primeiro de muitos, pois essa luta é muito importante”, finalizou Milton Viário, presidente da Federação dos Metalúrgicos.
Fonte: João Marcelo Pereira dos Santos, educador do CAMP — Centro de Assessoria Multiprofissional